green plant on brown soil

Agricultura Regenerativa: Definição, Práticas e Perspectivas Globais

A agricultura regenerativa é uma abordagem holística que busca restaurar e melhorar os processos ecológicos do solo e do agroecossistema, indo além de simplesmente manter a produtividade. Segundo a FAO, ela se concentra em conservar e revitalizar os processos biológicos do solo, harmonizando a produção agrícola com as dinâmicas naturais.

PLANTAS E CULTURAS

9/10/20257 min ler

A agricultura regenerativa é uma abordagem holística que busca restaurar e melhorar os processos ecológicos do solo e do agroecossistema, indo além de simplesmente manter a produtividade. Segundo a FAO, ela se concentra em conservar e revitalizar os processos biológicos do solo, harmonizando a produção agrícola com as dinâmicas naturais (1). Na prática, isso implica produzir alimentos enquanto se fomenta a biodiversidade e a fertilidade a longo prazo, gerando ecossistemas mais resilientes (1, 2). O Rodale Institute descreve esse modelo como “além da sustentabilidade”, melhorando ativamente os recursos naturais em vez de apenas preservá-los (3). Diferentemente da agricultura orgânica (que elimina agroquímicos) ou da agricultura “sustentável” convencional (que busca eficiência com menos impacto), a regenerativa integra estratégias amplas de restauração, captura de carbono e circulação de nutrientes. Por exemplo, a Regen. Int. afirma que a verdadeira agricultura regenerativa também deve ser orgânica (4), enquanto o Rodale enfatiza a inovação contínua para aumentar a saúde do solo e da comunidade biológica (3).

Princípios e Práticas Agronômicas Chave

A regeneração do agroecossistema se baseia em uma série de práticas agronômicas inter-relacionadas, todas voltadas para melhorar a saúde do solo e os fluxos naturais de água e nutrientes. Entre os princípios básicos, incluem-se a cobertura permanente do solo, a diversidade biológica e a integração de culturas e gado. Na prática, promovem-se, por exemplo:

  • Cobertura do solo: Uso de culturas de cobertura, acolchoamento ou mantas vegetais para proteger o solo da erosão e moderar a umidade. Esses cultivos (ou resíduos como folhas e restolho) mantêm o solo sempre coberto, o que aumenta a matéria orgânica e retém água (5, 6).

  • Rotação diversificada de culturas: Introdução de rotações longas e policulturas que alternam espécies diferentes, rompendo ciclos de pragas e promovendo maior biodiversidade biológica. Por exemplo, intercalar cereais, leguminosas e hortaliças melhora a estrutura do solo e distribui nutrientes de maneira equilibrada (6).

  • Compostagem e adubos orgânicos: Incorporação de composto, esterco animal e adubos verdes (green manure) para aumentar a matéria orgânica do solo. Esses aportes naturais nutrem a microbiota edáfica, melhoram a agregação do solo e reduzem a dependência de fertilizantes químicos sintéticos (6).

  • Agrofloresta e sistemas agrossilvipastoris: Integração de árvores e arbustos nas parcelas agrícolas, e a associação destes com culturas e gado. As árvores fornecem matéria orgânica (folhas), melhoram microclimas e armazenam carbono, enquanto o gado aporta esterco ao solo. Essas configurações mistas potencializam os ciclos de nutrientes e criam habitats mais diversos (4).

  • Pecuária integrada e pastejo holístico: Manejo planejado do gado dentro do sistema de cultivo. Por meio do pastejo rotativo ou holístico, o gado percorre sequências de piquetes, consumindo a vegetação de forma controlada e aportando esterco onde pasta. Isso fecha os ciclos de nutrientes e estimula a regeneração vegetal, ao mesmo tempo que melhora a diversidade do solo (4).

  • Manejo holístico do agroecossistema: Planejamento global da fazenda considerando seu ciclo hidrológico e biótico completo. A sabedoria dos ecossistemas naturais (por exemplo, sequências de pastejo semelhantes às manadas selvagens) é usada como referência para revitalizar a paisagem (4).

  • Redução ou eliminação do preparo do solo (laboreo): Prática de preparo mínimo (ou no-till) para preservar a estrutura do solo e a rede de raízes e insetos. Evitar o revolvimento profundo mantém o equilíbrio da matéria orgânica e reduz a erosão. Em vez de arar, usam-se semeadoras diretas e coberturas vegetais para manter uma camada protetora no solo (7, 8).

  • Uso mínimo de agroquímicos: Substituição de fertilizantes e pesticidas sintéticos por insumos orgânicos e biológicos. Isso favorece a vida microbiana do solo e evita desequilíbrios. O Rodale propõe eliminar completamente os insumos sintéticos, substituindo-os por adubos naturais e composto (7).

A cobertura permanente do solo (com cultivos de cobertura ou acolchoamento) é fundamental na agricultura regenerativa. Manter o solo coberto com plantas vivas ou mulch fornece matéria orgânica e atua como uma “esponja” no solo, melhorando sua porosidade e capacidade de reter água (5, 6). Ao mesmo tempo, reduz a erosão por chuva e vento, conservando a estrutura do solo. Por exemplo, aumentar 1% de matéria orgânica pode reter dezenas de milhares de litros adicionais de água por hectare a cada ano (9, 10), o que torna as culturas mais resistentes a períodos secos.

Outro pilar é a integração do gado no sistema produtivo. O pastejo rotacional ou silvipastoril, combinado com manejo holístico, permite que o gado percorra diferentes parcelas em ciclos planejados. Os animais fertilizam o solo com seu esterco e estimulam a vegetação, enquanto evitam o superpastejo. Assim, a dinâmica de nutrientes é melhorada e a interação natural entre gado e vegetação é emulada. Por exemplo, a adoção de sistemas silvipastoris (árvores + forragem + gado) tem demonstrado aumentar a biodiversidade e a fertilidade edáfica (4).

Em conjunto, essas práticas regenerativas restabelecem um ciclo fechado de nutrientes e água: o solo tem mais matéria orgânica e melhor estrutura, as raízes penetram mais profundamente e a infiltração melhora, e a biota do solo (minhocas, fungos, bactérias) se torna mais abundante. A regeneração do solo, por sua vez, alimenta as culturas, aumenta a estabilidade do ecossistema e cria um sistema mais sustentável ao longo do tempo (5, 9).

Evidência Científica de Seus Efeitos

Numerosos estudos avaliaram os impactos da agricultura regenerativa em diferentes indicadores.

  • Saúde do Solo: Campos regenerativos tendem a acumular mais matéria orgânica, vital para a fertilidade e a estrutura do solo (9). Ao se decompor em húmus, a matéria orgânica retém água e nutrientes, além de sustentar a vida microbiana. De fato, solos com maior MO têm mais porosidade e atuam como reservatórios de água, o que melhora a resistência das culturas a secas e reduz a erosão (9, 11).

  • Biodiversidade: Sistemas regenerativos geralmente abrigam comunidades mais ricas e funcionais. Um estudo do WBCSD informa que campos regenerativos nos EUA registraram dez vezes menos pragas do que as culturas convencionais, o que evidencia um controle natural mais eficaz (14). A combinação de policulturas, coberturas vivas e ausência de pesticidas fomenta insetos benéficos, minhocas e fungos úteis.

  • Emissões e Carbono: A agricultura regenerativa tem um papel promissor, mas sujeito ao contexto. Estudos recentes (CGIAR) estimam que as práticas regenerativas poderiam sequestrar de 4,3 a 6,9 gigatoneladas de CO₂ por ano nos solos agrícolas – quase metade das emissões anuais globais de combustíveis fósseis (17). A menor dependência de fertilizantes nitrogenados e a cobertura constante reduzem as emissões de N₂O e as perdas de carbono.

Indicadores e Métricas de Impacto Regenerativo

Para avaliar quantitativamente os efeitos regenerativos, diferentes indicadores agroecológicos são usados. Entre os mais comuns estão: o carbono do solo (medido em tC/ha na camada arável), que reflete a capacidade do solo de armazenar carbono; a infiltração/permeabilidade do solo (em mm/h ou volume infiltrado), que mostra sua aptidão para absorver água; e índices de biodiversidade (como riqueza e abundância de macroinvertebrados, fungos ou polinizadores), que medem a recuperação biológica.

Casos Internacionais de Sucesso e Perspectiva Global

A agricultura regenerativa já é aplicada em diversos contextos com resultados notáveis:

  • México: A ONG Nature Conservancy documentou o caso de uma produtora em Chiapas que, ao adotar coberturas vivas e manejo sem queima, duplicou seu rendimento de milho (de ~2,5 para ~8,5 t/ha) enquanto recuperava a saúde do solo (12).

  • Índia: O WWF colabora com comunidades algodoeiras orgânicas, conseguindo que a pecuária regenerativa aumente a fertilidade do solo e proteja a vida selvagem local (16, 21).

  • Espanha: A Associação AlVelAl lidera projetos de restauração agroecológica que combinam oliveiras, cereais e pastagens para regenerar devesas tradicionais (22).

  • EUA: O agricultor Gabe Brown (Dakota do Norte) melhorou notavelmente a qualidade de seus solos sem insumos sintéticos (23). Grandes empresas (por exemplo, PepsiCo, General Mills) estão implementando práticas regenerativas em suas cadeias de suprimentos.

Organismos globais como a FAO e o IPCC reconhecem o potencial da agricultura regenerativa para a resiliência climática e a segurança alimentar. A iniciativa “4 por mil” (COP21) promove o aumento do carbono no solo como um mecanismo climático.

Críticas e Limitações

Apesar dos benefícios, a agricultura regenerativa enfrenta questionamentos e desafios.

  • Aplicabilidade e Rendimento: Críticos apontam que muitas práticas populares não garantem benefícios universais sem adaptação local (8). Estudos observaram que, a curto prazo, os rendimentos em sistemas regenerativos podem ser menores (PeerJ reportou 29% menos rendimento de milho), embora essas perdas frequentemente sejam compensadas pela redução de custos e por preços mais altos, levando a maiores lucros líquidos (18).

  • Dados e Certificação: Há falta de dados científicos a longo prazo, e ainda não existe uma certificação unificada globalmente. Críticos apontam que a regeneração não é uma solução mágica sem contrapartidas; requer acompanhamento técnico, incentivos econômicos e marcos regulatórios favoráveis.

Conclusão

A agricultura regenerativa propõe transformar paradigmas convencionais ao restaurar ativamente o solo e os recursos naturais. A evidência acumulada indica melhorias na fertilidade do solo, captura de carbono e resiliência climática, junto com benefícios econômicos em muitos casos (9, 20). No entanto, sua implementação em grande escala dependerá de fatores contextuais: capacitação técnica, subsídios adequados e vontade política. Em termos técnicos, o modelo é promissor como parte da solução para a crise agroambiental global, mas não substitui completamente outras estratégias. Sua viabilidade em grande escala exige a adaptação das práticas a cada região e a medição rigorosa dos resultados. Em resumo, a agricultura regenerativa pode ser uma via eficaz para transformar a agricultura convencional e contribuir para a segurança alimentar e climática, desde que seja aplicada com conhecimento agronômico, evidências científicas e respaldo institucional (8, 9).

Fontes: Documentos da FAO, Rodale Institute, WWF, TNC e estudos acadêmicos relevantes (1, 9, 12, 17, 18, 21).

(1) Agricultura regenerativa: aliada para un futuro sostenible | FAO

https://www.fao.org/family-farming/detail/es/c/1739429/

(2, 18) Regenerative agriculture: merging farming and natural resource conservation profitably [PeerJ]

https://peerj.com/articles/4428/

(3, 25) Agricultura Orgánica Regenerativa - Rodale Institute

https://rodaleinstitute.org/es/por-qu%C3%A9-org%C3%A1nico/fundamentos-org%C3%A1nicos/agricultura-org%C3%A1nica-regenerativa/

(4) Cómo las mejores prácticas de agricultura y uso de la tierra orgánicas y regenerativas pueden revertir el calentamiento global - Regeneration International

https://regenerationinternational.org/2021/03/11/como-las-mejores-practicas-de-agricultura-y-uso-de-la-tierra-organicas-y-regenerativas-pueden-revertir-el-calentamiento-global/

(5, 11) El suelo y el agua en Agricultura Regenerativa

https://www.agriculturaregenerativa.es/suelo-y-agua/

(6, 7, 9) rodaleinstitute.org

https://rodaleinstitute.org/wp-content/uploads/Rodale-Soil-Carbon-White-Paper_v11-compressed.pdf

(8) (PDF) Regenerative Agriculture: An agronomic perspective

https://www.researchgate.net/publication/349732241_Regenerative_Agriculture_An_agronomic_perspective

(10) Organic Matter Can Improve Your Soil's Water Holding Capacity

https://www.nrdc.org/bio/lara-bryant/organic-matter-can-improve-your-soils-water-holding-capacity

(12, 13) Nature

https://www.nature.org/es-us/que-hacemos/nuestra-vision/perspectivas/agricultura-regenerativa-mexico-aumenta-cosechas-restaura-naturaleza/

(14, 17, 19, 20) These regenerative agriculture trials prove that farming can improve soil health without sacrificing yield | WBCSD

https://www.wbcsd.org/news/these-regenerative-agriculture-trials-prove-that-farming-can-improve-soil-health-without-sacrificing-yield/

(15, 16, 21) ¿Puede la agricultura dentro de los corredores de vida silvestre beneficiar a las personas y la biodiversidad? | Historias | Descubre WWF

https://www.worldwildlife.org/descubre-wwf/historias/puede-la-agricultura-dentro-de-los-corredores-de-vida-silvestre-beneficiar-a-las-personas-y-la-biodiversidad

(22, 23) Agricultura regenerativa: Casos de éxito

https://isam.education/agricultura-regenerativa-casos-de-exito/

(24) Ganadería y Agricultura Regenerativa | FAO

https://www.fao.org/family-farming/detail/es/c/1376589/